sexta-feira, março 18, 2005

Prisão

Escuro e apertado. É assim o sítio onde eu estou. Respirar é difícil, os movimentos são penosos. Queria fugir, mas não consigo. Estou completamente amarrado. Estou preso dentro de um sítio que não compreendo perfeitamente, que me assenta como se tivesse sido feito à medida inversa da minha vontade de me libertar. Olho em redor e vou vendo as coisas de um limitadíssimo prisma, o único que é possível ver de onde estou. Olho numa direcção, depois noutra: entretanto perdi a primeira. Perco-me dentro deste sítio, ele tem espaços e segredos que não desvendo de forma alguma, por muito que tenha tentado. E dói. É doloroso estar aqui. É enervante estar aqui. Tudo é tão desproporcional. Tenho tamanho a mais para estar aqui. Como foi que ainda nada se partiu? Eu movo-me tão pesadamente porque esta não é a escala de quem eu sou. A graciosidade não é para mim porque simplesmente ela está fora do meu alcance físico. Outros, vejo-os a andar sem tropeçar em nada, sem sequer vacilarem nos seus passos: leves e quase etéreos - mas eu não. Estou amarrado ao quadrado do infinito. De cada vez que embato contra alguma coisa, consigo realmente sentir a dilaceração. É algo de perfeitamente real, que há quem não tenha sentido. Se calhar esses não estão presos, apesar de estarem ao meu lado. Ou então não têm o meu tamanho... Não sei, não consigo avaliar as escalas destas dimensões tão bem como faço com outras coisas. Mas sei que a leveza deles contrasta horrivelmente com o meu tamanho, com o meu peso, com as minhas vontades que se traduzem em acções desastradas. Por muito que me tente mexer, por muito que faça algum esforço para conseguir soltar-me e para ganhar a liberdade por que anseio há tanto tempo, simplesmente continuo no mesmo sítio, irrevogavelmente preso. Sim, eu sei que não há escapatória. Eu sei que não há saída porque nem sequer há entrada. Eu sei que esta condenação é para sempre.

Só que eu sinto-me tão grande...! Sinto que nos meus cabelos poderiam dançar supernovas, que nas minhas mãos morreriam estrelas velhas e que me banharia com os jactos de matéria e energia que saem dos buracos negros. Sinto que poderia tocar num planeta com a ponta do dedo e logo ele se tornaria verdejante, ou então pó galáctico. Que com um mero pensamento mudaria os cursos dos rios e faria o vento voltear à minha volta para eu me poder sentir como se voasse. Sinto-me até como se conseguisse voar! Um olhar para o infinito, um mero acto de vontade e escapar-me-ia para o ar, depois para o vácuo, e percorreria num instante momentaneamente infinito todo o Universo, e para além do próprio Universo, ajudando a desdobrar e a revelar o espaço e o tempo. E eu estaria assim solto e estaria na posse da minha graciosidade, a que está à minha escala, a que tem o poder de me fazer feliz para além de qualquer descrição que se possa associar a esta palavra!!! Seria finalmente livre de me desdobrar, de me revelar, de explodir, de implodir, de mover-me nas 4 dimensões e inventar uma quinta.

Só que estou preso. Dentro do meu corpo. Eu sou tão grande e o meu corpo é tão pequeno porquê?